terça-feira, 26 de setembro de 2017

Do poema ao bruxo: a alquimia do professor

Jason de Lima e Silva

Preâmbulo para a abertura do Seminário PIBID (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência), que ocorreu no último sábado. Nesse programa coordeno, junto com o professor Cleber Duarte Coelho, o subprojeto Filosofia. A escola avalia o PIBID era o tema do encontro.

Fui convidado pelos organizadores do evento, a professora Adriana Mohr e o professor Hamilton Godoy, a apresentar algo breve como parte de sua abertura. Algo significativo, provavelmente para fazer jus à palavra seminário, que vem de seminarium e semen do latim, e que significa sucessivamente viveiro e semente, mas também escola e fonte. A ideia é ler um poema de Carlos Drummond de Andrade. Um poema que ele escreve a Machado de Assis, nem é preciso dizer, escritor de primeira grandeza na constelação da nossa literatura: negro, filho de pais escravos alforriados, nascido em 1839 na capital do Império brasileiro, Rio de Janeiro. O poema se chama A um bruxo, com amor. Ele foi escrito em 1959, poucos anos antes de nosso penúltimo golpe de Estado. Machado não é nomeado no poema, mas a Rua Cosme Velho onde viveu e todas as suas personagens, boa parte personagens femininas, reaparecem como fantasmas vivos na memória daquele que o homenageia, o próprio poeta. A ideia é comparar a figura do professor à figura do bruxo ou do alquimista, que dentro de seu seminário, dentro de sua escola, lança as sementes depois de colhê-la do mundo lido e observado, vivido e estudado. A forma de apanhá-las para o florescimento das potencialidades, ou para a transformação de seu ser, dependerá em parte da curiosidade de quem aprende, em parte da generosidade de quem ensina (sem falar das condições oferecidas pela escola, segundo uma política voltada para a excelência da educação pública e democrática). Vamos ver se vale a analogia. Se valer, serve o poema também de homenagem ao professor ou professora, que como alquimista recolhe e lança as sementes do mundo para cada qual resolver o seu próprio enigma, entre os livros e a vontade de amar, como diz o poema. Não é um bruxo do vaticínio ou da adivinhação, mas o sinal para uma destinação possível, quando o afeto de quem aprende se encontra com o valor de quem ensina, pela vontade de compreender o mundo físico ou histórico, linguístico ou social, matemático ou político. Fonte do diálogo entre a dúvida e o saber, o professor espalha no viveiro as sementes reunidas e depois desaparece da vista, dissolve-se, quer lembremos de seu nome, quer esqueçamos definitivamente de sua fisionomia ou de sua voz. Vamos ao poema.

René Magritte, O mestre-escola, 1954

A um Bruxo, Com Amor

Carlos Drummond de Andrade,
do livro A vida passada a limpo,1959

Em certa casa da Rua Cosme Velho (que se abre no vazio)
venho visitar-te; e me recebes
na sala trajestada com simplicidade
onde pensamentos idos e vividos
perdem o amarelo
de novo interrogando o céu e a noite.

Outros leram da vida um capítulo, tu leste o livro inteiro.
Daí esse cansaço nos gestos e, filtrada,
uma luz que não vem de parte alguma
pois todos os castiçais
estão apagados.

Contas a meia voz
maneiras de amar e de compor os ministérios
e deitá-los abaixo, entre malinas
e bruxelas.
Conheces a fundo
a geologia moral dos Lobo Neves
e essa espécie de olhos derramados
que não foram feitos para ciumentos.

E ficas mirando o ratinho meio cadáver
com a polida, minuciosa curiosidade
de quem saboreia por tabela
o prazer de Fortunato, vivisseccionista amador.
Olhas para a guerra, o murro, a facada
como para uma simples quebra da monotonia universal
e tens no rosto antigo
uma expressão a que não acho nome certo
(das sensações do mundo a mais sutil):
volúpia do aborrecimento?
ou, grande lascivo, do nada?

O vento que rola do Silvestre leva o diálogo,
e o mesmo som do relógio, lento, igual e seco,
tal um pigarro que parece vir do tempo da Stoltz e do gabinete Paraná,
mostra que os homens morreram.
A terra está nua deles.
Contudo, em longe recanto,
a ramagem começa a sussurar alguma coisa
que não se estende logo
e parece a canção das manhãs novas.
Bem a distingo, ronda clara:
É Flora,
com olhos dotados de um mover particular
ente mavioso e pensativo;
Marcela, a rir com expressão cândida (e outra coisa);
Virgília,
cujos olhos dão a sensação singular de luz úmida;
Mariana, que os tem redondos e namorados;
e Sancha, de olhos intimativos;
e os grandes, de Capitu, abertos como a vaga do mar lá fora,
o mar que fala a mesma linguagem
obscura e nova de D. Severina
e das chinelinhas de alcova de Conceição.
A todas decifrastes íris e braços
e delas disseste a razão última e refolhada
moça, flor mulher flor
canção de mulher nova...
E ao pé dessa música dissimulas (ou insinuas, quem sabe)
o turvo grunhir dos porcos, troça concentrada e filosófica
entre loucos que riem de ser loucos
e os que vão à Rua da Misericórdia e não a encontram.
O eflúvio da manhã,
quem o pede ao crepúsculo da tarde?
Uma presença, o clarineta,
vai pé ante pé procurar o remédio,
mas haverá remédio para existir
senão existir?
E, para os dias mais ásperos, além
da cocaína moral dos bons livros?
Que crime cometemos além de viver
e porventura o de amar
não se sabe a quem, mas amar?

Todos os cemitérios se parecem,
e não pousas em nenhum deles, mas onde a dúvida
apalpa o mármore da verdade, a descobrir
a fenda necessária;
onde o diabo joga dama com o destino,
estás sempre aí, bruxo alusivo e zombeteiro,
que resolves em mim tantos enigmas.

Um som remoto e brando
rompe em meio a embriões e ruínas,
eternas exéquias e aleluias eternas,
e chega ao despistamento de teu pencenê.
O estribeiro Oblivion
bate à porta e chama ao espetáculo
promovido para divertir o planeta Saturno.
Dás volta à chave,
envolves-te na capa,
e qual novo Ariel, sem mais resposta,
sais pela janela, dissolves-te no ar.

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Sede de Educação

Professor Sandro Livramento

“— Estamos vendo as medidas que podemos tomar. Mas depende muito do que a professora quer fazer. A gente não consegue entender de onde saiu essa ideia.” (frase do secretário de educação de Jaraguá do Sul, Rogério Jung para reportagem do clicrbs, 7 de setembro)

Existem muitas possibilidade no caminho da educação. Certamente nenhuma delas é melhor do que a outra ou está em posição privilegiada. Mas em todos os casos, sem exceções, esses caminhos devem levar a uma sociedade mais equilibrada e justa. Caso não seja essa a finalidade, então não é educação.

Um grupo de meninas de 11 anos deu água da privada para sua professora. Não bastando esse horror, a água foi “batizada” com comprimidos. Surpresa?! Infelizmente não.

O espaço da escola pública virou (sempre foi) um lugar de conflito. O que era um conflito entre a classe trabalhadora e as classes dominantes, representadas por seus governos, responsáveis por suas muitas ingerências, por seus descasos e por falta de caminho consolidado para proporcionar uma educação crítica, virou um conflito entre todos. Evidente que tais ingerências também são um projeto de educação, como afirmou Darcy Ribeiro: "A crise da educação no Brasil não é uma crise, é um projeto."

Dito e dado este fato, o conflito agora atinge seu ápice com marcados confrontos entre os muros das escolas das salas de aulas. São socos, xingamentos, ameaças e todo tipos de agressão. Tudo devidamente autorizado pelo estado-maior das secretarias e dos seus gestores. Sim, coloquem na conta deles o sucesso do seu incrível projeto de educação. Trabalhadores da educação e os filhos dos trabalhadores são vítimas desse projeto. Agora, sem um caminho seguro, eles se digladiam pela miséria de um espaço sem sentido e sem vida.

Os profundos descasos representados pela falta de estrutura, por baixos salários, pela precarização, pelo sucateamento e pela falta de um projeto da classe trabalhadora e para a classe trabalhadora, faz mais uma vez o seu papel. Joga aos jornais os cadáveres necessários para vender a ideia de que é preciso intervir. Assim, pipocam casos e mais casos e os especialistas de plantão dão suas sentenças: faliu, ruiu, desmoronou! Claro que depois vêm as soluções mágicas e prontas. A escola sem partido é uma delas. A militarização é outra. A busca por gestões mágicas e terceirizadas, como a parceira de institutos privados e do sistema patronal são as em voga no momento. Assim, em silêncio, e com o clamor do momento, avança o famigerado apontamento feito pelo mestre Darcy.

Não percebemos que a educação, que a vereda da educação é um espaço do pensar calmo e do fazer cotidiano. Somente podemos reagir com sabedoria se pudermos pensar com a calma necessária para saber o que nesse espaço pode ser transformado.

É certo que essa necessidade passará por um apontamento importante: o espaço da educação do filho do trabalhador e feito por um trabalhador. Não podemos entregar de bom grado sua concepção para pseudos gestores e pseudos intelectuais. Não podemos permitir ser guiados pela crise. Precisamos resgatar o sentido desse existir, desse fazer e dessa possibilidade de criar caminhos para a mais importante intervenção do homem pela sua humanidade. A educação não pode ser um espaço pobre, feito por um trabalhador pobre e para trabalhadores empobrecidos.

Que esse espaço seja o espaço da sede do conhecimento, pela sede de sabedoria e pela busca da nossa humanidade. Afinal, como cantou o poeta:

“Traga-me um copo d'água, tenho sede.  
E essa sede pode me matar.
Minha garganta pede um pouco d'água.
E os meus olhos pedem teu olhar.
A planta pede chuva quando quer brotar.
O céu logo escurece quando vai chover.
Meu coração só pede teu amor.
Se não me deres, posso até morrer.

Gilberto Gil, "Tenho sede", do álbum Refazenda, 1975

Gilberto Gil, Acústico para MTV, 1994



quinta-feira, 7 de setembro de 2017

A era dos espelhos

Filósofo: Diga-me então como viver aqui, se qualquer dúvida já lhes parece um crime? Conversar se tornou uma recreação clandestina.
Escritor: Já não é época para os ouvidos, e quando ouvem, não compreendem. Em contrapartida, as línguas andam afiadas, cheias de tiques para delatar o primeiro que escolhem para acusado, desde que lhes garantam os prêmios. Se faltar a língua, aponta-se o dedo, e ganha-se a liberdade.
Filósofo: Sim, por isso pergunto: como é possível viver neste lugar? 
Escritor: Já não é um lugar, não há mais lugar. Está tudo fechado. Melhor, está tudo aberto. Veja quantos buracos por todos os lados, nas paredes, no chão, nos olhos das pessoas, buracos de medo e de ódio. Arrancam de nossa terra tudo o que temos, luz e floresta, sangue e petróleo, e mais  buracos.
Filósofo: Sim, e o sangue é do povo. Com a ração do governo, o povo não pensa, mas ainda sangra, e aceita de boa vontade sofrer. 
Escritor: Muita gente do povo se julgou rica nos anos dourados, repudiou o governo por dar muita coisa aos pobres, maldisse a justiça por favorecer o trabalhador. O pobre esqueceu de que foi pobre, virou empresário. Agora paga juros ao banco e sua pastelaria não tem clientes, mas continua ligada a TV, e no mesmo canal.
Filósofo: E como vive aquela classe lá adiante nos arranha-céus! Veja só. Andam assustados com a própria sombra, enfurnados nos seus caixotes iluminados, a beira de um colapso, tomados pela insônia na madrugada. Não há que fazer! Por onde afinal recomeçaríamos?

Giorgio de Chirico, O grande jogo (Plaza de Itália), 1971

Escritor: A humanidade? Pelo fim. Só não sabemos o quanto ainda será necessário destruir para termos gente ao nosso lado... e recomeçarmos.
Filósofo: Os bem-sucedidos, os sábios charlatões, os juízes monomaníacos, todos eles abriram muitos buracos nesta Colônia, já maltratada há séculos. Agora nos calam.
Escritor: Talvez em breve nos matem.
Filósofo: Não, que dizes! E restaria algo?
Escritor: E o que resta agora? diga-me. Somente essa grande cidade de espelhos cercada de prédios blindados de vidro, aí estão os sócios, os seguidores discretos e exaltados, os bajuladores de toda a ordem, os empresários falidos também, os pastores propondo suas leis nas assembleias, empreendedores da fé, como babam, meu senhor! os rentistas sempre, sugando a fonte infindável das dívidas! Viste os revoltados da pátria? pedem agora colo para suas mães. Que pátria existe depois da festa sobre nossos minérios e do charco aberto pelos transgênicos? 
Filósofo: Lembre-se, temos de andar pelas margens para os espelhos não nos alcançarem, os atalhos sempre! Se capturam nosso reflexo, somos facilmente confundidos.
Escritor: Eles próprios já não suportam a proliferação de suas imagens. Por isso desejam a guerra, a guerra ou morrem do tédio consigo na frente de seus pares. A guerra pelos espelhos é a primeira de todas. Olhe quantas de suas miragens se projetam nas telas dos edifícios: a lenda, o fabuloso, o herói!
Filósofo: O guerreiro imortal! Boceje à vontade, aqui está o banco, vamos nos sentar e comer. Essa praça ainda é o nosso refúgio e hoje temos um pouco de luz sobre os plátanos e sobre as folhas que cobrem o caminho.
Escritor: Um gole de café, meu amigo, vamos falar baixo e nos sentir livres.
Filósofo: O ar selvagem de um parque abandonado assusta até a polícia, e nos protege.
Escritor: Sim, sim, mas por que afinal seríamos perigosos?

Jason de Lima e Silva

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Educação e soco na cara

Por Sandro Livramento, professor


“Se eu tiver que ser voz do magistério brasileiro, que está muito abandonado, eu vou ser. Inclusive a mídia está nos abandonando, a sociedade, o governo, as famílias. Todos têm culpa. Todos ajudaram a deixar meu olho roxo” (profª. Márcia Friggi ao Notícias do Dia, de 21 de agosto).
O que as “reformas” atuais, como a reforma do ensino médio, a reforma trabalhista, tem a ver com a agressão contra a professora Márcia Friggi?
Resposta: Tudo!
A professora Márcia Friggi não é a única e nem será a última (infelizmente) a ser agredida por um aluno descontrolado e desamparado.
As marcas da agressão, um olho roxo e um corte profundo no supercílio são certamente doloridas e nos deixam tristes e perplexos. Solidariedade, professora! Nosso total apoio e acolhida a sua dor e a sua luta. Ela é nossa também.
Mas é preciso voltar lá atrás e entender que esse soco foi dado muito antes. Também é preciso entender que a mão do garoto que proferiu tal soco é conduzida a fazer tal ato. Como assim?
Ora não sejamos ingênuos. O atual estado da educação brasileira é um projeto das classes dominantes e da elite política. Ao sermos abandonados e cotidianamente desrespeitados pelos governantes, pelos políticos e pela justiça, somos expostos a todo e qualquer tipo de violência. Assim, o soco na cara de uma indefesa professora, mulher, é na verdade a tradução desse desrespeito simbolizado por baixos salários (uns dos motivos pelos quais, provavelmente, a professora dava aula no EJA como ACT (Admitido em Caráter Temporário), jornadas desumanas, falta de estrutura nas escolas, falta de apoio pedagógico, falta de condições mínimas de fazer o mínimo trabalho pedagógico com uma mínima qualidade. 
O soco vem sendo dado há muitos anos. Por todas as esferas da sociedade, inclusive muitos setores da esquerda que abandonaram esse espaço de luta. Por todos os agentes políticos, inclusive sindicatos que esqueceram as bases e apontaram seus projetos para outros horizontes.
Para quem torce o nariz para essas pequenas verdades, um conselho: você também sustenta essa violência contra os trabalhadores da educação quando paga para não se incomodar, quando escolhe calar na esfera privada os descasos acumulados por péssimos salários pagos aos professores dos seus filhos (sim, péssimos!).


Rodríguez Castelao, A derradeira lección do Mestre, 1945
Coleccion Centro Galícia, Buenos Aires
Fonte: http://www.ciudadpintura.com


Na outra ponta, o adolescente. Sem limite, sem noção nenhuma de espaço ou esfera pública, vítima da injustiça cotidiana dos estados e das elites. Filho de uma estrutura familiar sufocada por jornadas de trabalhos insanas, em razão das quais os pais não podem acompanhar seus filhos nas escolas ou em reuniões pedagógicas. Mães e pais que são obrigados a fazer dupla ou tripla jornada para sustentar suas famílias. As escolas acabam virando depósito de gente, de indivíduos, de coisas. Imagine você as condições de um pai ou uma mãe, depois de mais de 8 horas de trabalho (talvez mais!), chegar em casa e fazer a lição, conversar com seu filho ou ir à escola dele?
Mas tudo isso vai ficar muito pior. As reformas do ensino médio, trabalhistas, as leis insanas (como a lei da mordaça e das terceirizações), vão empurrar cada vez mais esses sujeitos (professores e alunos) para o gueto da sociedade. Olhos roxos e supercílios abertos já são rotinas, se tornaram conteúdo. Tais “reformas” são vetores de mais violência, de mais confronto. Vão esvaziar qualquer possibilidade de educação de dialogo e transformar esses sujeitos em personagem de um teatro de horror. Logo não serão socos, será a morte!
Tudo isso alimentado por governos e pela elite que abandonaram um projeto de sociedade justa. Que apostaram na mercantilização da educação. Que apostaram em leis inócuas como a lei do piso, que garante tudo e nos dá nada. Que obriga centenas de milhares (maior categoria do serviço público) a precarização de sua profissão. Que aposta em uma escola vazia de sentido e voltada para o lado pragmático do deus do mercado.
Vale lembrar um episódio vivido por um grupo de professores de uma escola estadual no sul da ilha: um procurador do estado ao ser confortado por denúncia das péssimas condições de trabalho e estudo vividas ali naquele local (ele estava na escola), disse com todas as letras: “Vocês podem dar aula até debaixo de árvores, o problema não é nosso!” Se o ministério público estadual tem esse cara como responsável pela fiscalização das ações do estado na educação pública, por que estranhar esse soco?
O soco em Márcia e a atitude do adolescente é a síntese do que é o projeto de educação das elites e dos seus representantes (governos): um sucesso! Sim, sucesso. Porque o nosso fracasso é o sucesso deles. Cada menino e menina que eles colocam para rua da escola ou atrasam sua formação é mais um trabalhador precarizado e pronto para ser explorado por qualquer mísero centavo. Ou vai alimentar as estatísticas de violência e justificar as ações do estado policial que só engorda mais e mais as empresas. Ou será cooptado por grupos fundamentalistas evangélicos que farão sua cabecinha: dizer não ao estado laico, as liberdades religiosas, a questão de gênero, etc.
Sucesso porque este projeto impossibilita a luta de classe. Joga professores contra alunos e suas famílias, sociedade contra professores e contra essas famílias. Massacra trabalhadores fazendo trabalhar até a morte. Em tripla jornada, sem descanso, sem folga e com todo tipo de ameaça no horizonte.
Sim as “reformas”, as leis da mordaça e terceirização têm muito a ver com o soco recebido pela professora Márcia. Tem tudo a ver com a forma violenta de “dialogar” do adolescente.
 Na voz dela uma sentença:
 “Eu fiz o boletim de ocorrência, o que eu tinha que fazer, eu fiz. O resto, a vida vai se encarregar. A vida vai ser bem mais rude com ele do que eu fui. Eu não tenho nada a dizer para esse rapaz, o que eu queria dizer para ele era dentro da sala de aula, mas ele não quis escutar como aluno. Eu só tenho a dizer para os meus bons alunos, que são respeitosos, que respeitam seus pais, que são solidários a mim. A eles, sim, eu tenho muitas coisas bonitas a dizer” (profª. Márcia Friggi ao DC).
O problema é que ele logo estará em uma esquina te esperando caro leitor, para mais um soco no teu olho. Assim, esse problema é teu. Tua simples solidariedade é inútil. Tua indignação deve voltar-se para aqueles que propositalmente fizeram desse projeto de educação pública e das “reformas” as suas armas  para calar e sufocar a classe trabalhadora.
É preciso encerrar esse texto dizendo: a luta é de classe e o espaço da escola e da educação é o espaço do exercício dessa luta. Ao negá-lo, ao negligenciá-lo, matamos a luta e nos aliamos aos desígnios e desejos de um projeto que não é o nosso e sim da burguesia.
À professora Márcia Friggi a nossa solidariedade de classe.
Ao menino e aos meninos e meninas, dizer que essa professora e a educação é a melhor chance deles não levarem mais um soco da vida. Que somente nossa solidariedade, nosso fazer vai construir outro projeto de sociedade que não passa pela mercantilização da vida!